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"A ciência não pode ser mantida sem amarras por muito tempo em um
sistema social que pretende exercitar controle completo sobre a vida
intelectual e espiritual de uma nação. A correção de uma teoria
científica não pode jamais ser aferida pela sua disposição em oferecer
respostas desejadas por uma liderança política". (LEONES, C. A².)
Sempre
que eu ouço que alguma figura política tentou legislar sobre a ciência
para adequar alguma conveniência de suas crenças - e isso acontece com
alguma frequência, mesmo aqui nos Estados Unidos - me vem à memória as
aulas de biologia e a história de Trofim Lysenko nos anos recentes da
União Soviética.
Lysenko, o diretor de biologia de Joseph Stalin,
era o líder de um grupo de agricultores e criadores de animais que
rejeitavam a ciência da genética - especialmente como desenvolvida por
Gregor Mendel e Thomas Hunt Morgan - como sendo forasteira, pouco
prática, idealista e um produto do "capitalismo burguês". Ao invés
desses, estes soviéticos promoviam o trabalho de seu compatriota Ivan.
V. Michurin. Michurin cria em uma forma neo-Lamarquista de evolução³.
Você talvez se lembre do exemplo clássico de evolução Lamarquista em que
as girafas esticavam seus pescoços até suas longas formas e que, então,
passavam adiante essa característica para seus descendentes diretos. O
sistema de Michurin era uma forma avançada disso.
A biologia
Michirinista, que posteriormente se transformou em Lysenkoismo, era
conveniente para um governo Soviético então tentando criar a perfeita
utopia social. Sob esse sistema, eles pensaram poder rapidamente forçar
plantas e animais, e mesmo o povo soviético, a tomar formas que poderiam
servir funções práticas: por exemplo, Lysenko afirmou que ele havia
transformado um trigo de primavera em um trigo de inverno em apenas
alguns anos. Naturalmente, isto era impossível - particularmente porque o
trigo de verão possui dois cromossomos e o trigo de inverno tem três - e
a possibilidade mais provável é que seu experimento tenha sido
contaminado, mas Lysenko tinha grande poder e suas assertivas raramente
eram disputadas.
Lysenko veio a dominar a biologia soviética com
um discurso em 1948 - preparado em parte pelo próprio Stalin - em que
Lysenko denunciava Mendel e declarava os propositores desse tipo de
ciência em inimigos do povo. Cientistas que discordaram das teorias de
Lysenko foram expurgados - alguns mandados para Gulags enquanto outros
simplesmente desapareceram.
Os resultados foram inevitáveis: a
biologia soviética decresceu ao ponto de quase parar, até que uma série
de falhas nas colheitas gerou uma forte escassez de alimentos e forçou a
remoção de Lysenko em 1965, embora sua estrela já tivesse começado a
perder o brilho depois da morte de Stalin em 1953. No resto do mundo a
ciência avançou - como ela faz quando pesquisadores possuem a liberdade
para explorar novas e velhas idéias - deixando os biólogos soviéticos
comendo poeira.
A lição aqui? Precisamos nos lembrar que só
porque um ditador emite um decreto ou porque legisladores passam uma
lei, eles não mudaram a realidade. Ignorar a ciência em favor de uma
visão de mundo preferida pode ter consequências devastadoras.
[Autoria de S. Zielinski, 2010, Revista Smithsonian]
[Tradução de D. C. Corrêa, 2020]
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1. https://www.smithsonianmag.com/.../when-the-soviet-union.../ (original em inglês)
2. https://www.jstor.org/stable/3625986?read-now=1&seq=1... (requer um cadastro para ser lido, em inglês)
3. https://blog.biologiatotal.com.br/darwin-e-lamarck/ (eu não tenho a pretensão de que todos se recordem de Lamark. Se houver interesse, o link explica brevemente suas idéias)
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